Hoje inicia-se mais uma série de posts temáticos aqui no pilha-livros. Depois de Argumento Adaptado, dedicado ao cinema e publicado todas as Quintas, surge o Notas de Tradução. Sem dia fixo de publicação mas de aparição regular, será espaço para análise de obras de Teoria da Tradução, para destaque de edições bilingues (de qualquer género literário), será lugar de publicação de excertos de obras na língua original e numa de tradução, dará eco aos nossos desejos de tradução de certas obras, e como certas traduções poderiam ter sido evitadas...
Num momento em que esta actividade é muito falada, seja pela boa (ou má) qualidade das traduções, ou até pela maior importância que por vezes se parece dar a estas, em detrimento das próprias obras originais, este será um seu espaço de divulgação, análise e discussão, que mais uma vez se abre a todos os que sentirem ter uma contribuição para dar. Para começar, uma pequena apresentação de Sobre os Diferentes Métodos de Traduzir, de Friedrich Schleiermacher.
Não é comum vermos, no panorama editorial português, obras não-poéticas em formato bilingue, condição essencial para se constatar onde está a arte do autor e o engenho do tradutor (ou onde estão ambos). A Porto Editora, através da sua colecção Elementos Sudoeste, dá-nos essa possibilidade precisamente num texto que analisa a actividade de traduzir, e que tem apresentação, notas, tradução e posfácio de José M. Miranda Justo.
Através das palavras do tradutor podemos apercebermo-nos do que o autor nos quer transmitir com este texto:
«Os «métodos de traduzir» a que se refere Schleiermacher são dois e só dois, i.e., com explícita exclusão da possibilidade de qualquer terceiro. O tradutor estabelece uma mediação entre o autor do texto original e o leitor da tradução. Assim sendo, das duas uma, ou move o leitor tanto quanto possível até ao autor, ou move o autor quanto possível até ao leitor. No primeiro caso a actividade de traduzir tem em vista a restituição do específico no seu máximo estranhamento possível. No segundo caso tem em vista a anulação do estranho, a nacionalização do estrangeiro. E Schleiermacher não tem qualquer dúvida em defender as virtudes e as vantagens do primeiro método, apesar de todas as dificuldades e prejuízos, como também não hesita em afirmar que o objectivo do segundo método é não só «inalcançável» como «negativo».» pág. 165, incluído no posfácio
Escrito em 1813, por ocasião duma conferência na Real Academia de Berlim, e apesar de nalguns (poucos) pontos podermos constatar o afastamento temporal das ideias expostas, o que aqui se pode ler é um importante contributo na discussão dos princípios que guiam a actividade de tradução.
Sobre os Diferentes Métodos de Traduzir (Ueber die Verschiedenen Methoden des Uebersezens), de Friedrich Schleiermacher (trad. José M. Miranda Justo), edição bilingue, da Porto Editora, colecção Elementos Sudoeste, Novembro 2003, 206 pág., pvp: €7,60
Ainda falando dos métodos de traduzir, agora nas palavras do autor:
«Estes dois caminhos são tão diferentes que é necessário seguir exclusivamente um deles, com tanto rigor quanto possível, pois que qualquer mistura entre ambos dará um resultado altamente insatisfatório e é de recear que entre escritor e leitor se dê o desencontro total.» pág. 61
«A minha intenção é, pois, deixando de lado todas as questões particulares relativas a este objecto já tratadas pelos peritos nesta arte, considerar apenas os caracteres mais universais destes dois métodos, para assim preparar a possibilidade de discernir em que consistem as específicas vantagens e dificuldades de cada um deles, em que vertente, portanto, cada um deles mais completamente atinge o objectivo da actividade de traduzir, e quais as fronteiras de aplicação de cada um deles.» pág. 67
estas duas passagens podem ser lidas no original alemão no pilha-links.
(pistas nos caminhos da tradução: Tonino Guerra no pilha-livros, n’O Livro das Igrejas Abandonadas e n’O Mel, Fernando Pessoa, Eva Christina Zeller e Hermann Hesse no Eelko Van Mulder)
Sem comentários:
Enviar um comentário