«a partir das 15h e até quando a luz o permitir, terá lugar, na Livraria Almedina do Saldanha, em Lisboa, uma Cerimónia Ritual de Destruição de Livros de BD. A destruição será levada a cabo com a ajuda de pincéis, lápis de cor, marcadores e outras ferramentas igualmente letais e de efeito perdurável; no papel de Sumos-Sacerdotes Sacrificadores estará uma dupla de Abomináveis Homens Sem Sombra, o iníquo José Carlos Fernandes e o obnóxio Luís Henriques. O pretexto para este ritual é o recente lançamento do "Tratado de Umbrografia", volume inaugural das "Black Box Stories", série que se adivinha longa, molesta e funesta. No final será sorteado um rinoceronte entre os presentes. À saída, os participantes na cerimónia deverão certificar-se de que levam consigo as suas próprias sombras.»
...e também não é por roubar um pássaro ou um livro, que logo dá aos amigos, que o Alba tem as mãos sujas. chartapaciu@gmail.com
sexta-feira, novembro 24, 2006
quarta-feira, novembro 22, 2006
sábado, novembro 18, 2006
Zapping: Beco das Imagens
«REQUISIÇÕES
Linha vermelha, escadas rolantes e sol nos Olivais. Devolver os livros da quinzena passada e requisitar mais cinco. E agradecer à Bedeteca por disponibilizar um fundo bibliográfico muito simpático, onde há 'históricos', 'clássicos' e 'teóricos' de várias espécies e onde não faltam as novidades que nunca chegam às livrarias de cá ou os autores menos comercializáveis. E tudo de borla; basta mostrar o cartãozinho das BLX (que também não custa nada) e tratar bem as 'espécies' que se trazem para casa. Hoje vieram estes. Daqui a duas semanas há mais.»
Linha vermelha, escadas rolantes e sol nos Olivais. Devolver os livros da quinzena passada e requisitar mais cinco. E agradecer à Bedeteca por disponibilizar um fundo bibliográfico muito simpático, onde há 'históricos', 'clássicos' e 'teóricos' de várias espécies e onde não faltam as novidades que nunca chegam às livrarias de cá ou os autores menos comercializáveis. E tudo de borla; basta mostrar o cartãozinho das BLX (que também não custa nada) e tratar bem as 'espécies' que se trazem para casa. Hoje vieram estes. Daqui a duas semanas há mais.»
texto de Sara Figueiredo Costa
quinta-feira, outubro 05, 2006
Vamos ao Teatro?
«Esta é a história de um homem decepcionado, um cão velho que mia, uma máquina do tempo, um Uapiti que se deixa caçar, e outras dezassete personagens com diferentes ideias sobre o que é a felicidade.
Sob um céu demasiado baixo, uma solução que nos estralhaça vale mais do que qualquer incerteza?»
Adaptação do texto de Boris Vian, Erva Vermelha estará na Sala Estúdio do Teatro da Trindade de 13 de Outubro a 5 de Novembro, incluída na Trilogia do Cão (O Morto e a Máquina está em cena até 8 de Outubro, Timbuktu a partir de 11 de Novembro).
Mais informações na página do Teatro da Trindade.
Sob um céu demasiado baixo, uma solução que nos estralhaça vale mais do que qualquer incerteza?»
Adaptação do texto de Boris Vian, Erva Vermelha estará na Sala Estúdio do Teatro da Trindade de 13 de Outubro a 5 de Novembro, incluída na Trilogia do Cão (O Morto e a Máquina está em cena até 8 de Outubro, Timbuktu a partir de 11 de Novembro).
Mais informações na página do Teatro da Trindade.
quarta-feira, julho 19, 2006
terça-feira, julho 18, 2006
Zapping: La république des livres
«Nul besoin d'être collectionneur, bibliophile ou fétichiste pour éprouver l'irrépressible désir de caresser les pages de ce livre. Douce, vertigineuse et enivrante doit en être la sensation. Cela ne s'explique pas. La chose en question n'est autre que le premier recueil des pièces de Shakespeare jamais publié, en 1623 soit sept ans après sa mort. La Nuit des rois, Macbeth, Comme il vous plaira, Songe d'une nuit d'été, Peine d'amours perdues, La Mégère apprivoisée... Considéré comme "le plus important" opus de la littérature anglaise, il était la propriété d'une des plus anciennes bibliothèques municipales anglaises, celle du Dr William's, à Bloomsbury, qui veillait dessus depuis 1716. Or comme elle avait urgemment besoin de fonds pour ne pas péricliter, elle s'est résolue à céder son trésor.»
quinta-feira, junho 15, 2006
Biblioteca Municipal José Saramago - Loures
Agenda:
17 de Junho, 15h00
Histórias do arco da velha: sete cores, sete histórias
Classificação: para todas as idades.
24 de Junho, 15h00
Papapalavras
Animação para bebés e acompanhantes.
Traga a papa do bebé para ele a papar no papapalavras.
1 de Julho, 15h00
“Sábados em cheio” – animação para toda a família
O senhor distraído, de António Torrado
Do livro: Da Rua do contador à Rua do ouvidor
Uma história divertida dum senhor que perde tudo: os óculos, o pente, o chapéu-de-chuva, a caneta e até a cabeça.
Classificação: para todas as idades.
8 de Julho, 15h00
A árvore, de Sophia de Mello Breyner Andresen
Conto tradicional japonês recontado pela autora, resultante do seu primeiro encontro com o fascínio do Oriente.
Classificação: para todas as idades.
domingo, maio 28, 2006
Zapping: con valor
«Siempre hay algún libro que dé respuesta a nuestra necesidad más íntima»
«Me inquieta también la velocidad que condiciona nuestra actividad empresarial en esa loca rotación de novedades que han impuesto los grandes grupos de edición.»
«Este año, creo que hay coincidencia en calendario durante algunos días con el mundial de fútbol. Así que es posible que esta escena que hace ya unos añitos nos regalaba Forges se vuelva a repetir.»
«Me inquieta también la velocidad que condiciona nuestra actividad empresarial en esa loca rotación de novedades que han impuesto los grandes grupos de edición.»
«Este año, creo que hay coincidencia en calendario durante algunos días con el mundial de fútbol. Así que es posible que esta escena que hace ya unos añitos nos regalaba Forges se vuelva a repetir.»
domingo, maio 21, 2006
Zapping: Por um Triz
«É claro que, sempre que possível, eu compro livros (ou recebo alguns de presente), mas nem todos permanecem por muito tempo na minha estante, a não ser que eu goste muito deles -- o que tem acontecido raramente. Assim sendo, os exemplares vão ficando empilhados nas bordas livres das prateleiras até a época do ano em que costumo fazer doações para bibliotecas públicas. E minha estante volta à sua configuração original, ou quase. Mas também tenho uma mania curiosa: livros que li emprestado e que gostei, se eu encontrar um exemplar num sebo, não hesito: compro-o! -- pelo simples prazer de possuí-lo, e também "completar" minha coleção. Neste caso, não me importa tanto o estado do livro em si. Evidente que quanto mais novo melhor, mas se ele estiver desgastado não faz mal: eu também gosto de "restauração". E limpo folha por folha, lustro a capa, conserto a lombada, encapo com papel marmorizado... Ou seja, os livros não são, para mim, apenas um punhado de textos ordenados em páginas presas em capas com a mera finalidade de leitura, eles são também "objetos estéticos".»
terça-feira, maio 16, 2006
Penguin mania: Steinbeck + Capa, Henry James, Icelandic Family Sagas
«There was one woman, with an engaging face and a great laugh, whom Capa picked out for a portrait. She was the village wit. She said, "I am not only a great worker, I am twice widowed, and many men are afraid of me now." And she shook a cucumber in the lens of Capa's camera.
And Capa said, "Perhaps you'd like to marry me now?"
She rolled back her head and howled with laughter. "Now you, look!" she said. "If God had consulted the cucumber before he made man, there would be less unhappy women in the world." The whole field roared with laughter at Capa.»
A Russian Journal, de John Steinbeck, com fotografias de Robert Capa.
«In the first weeks the days were long; they often, at their finest, gave me what i used to call my own hour, the hour when, for my pupils, tea-time and bed-time having come and gone, I had before my final retirement a small interval alone. Much as I liked my companions this hour was the thing in the day I liked most; and I liked it best of all when, as the light faded - or rather, I should say, the day lingered and the last calls of the last birds sounded, in a flushed sky, from the old trees - I could take a turn into the grounds and enjoy, almost with a sense of property that amused and flattered me, the beauty and dignity of the place.»
The Turn of the Screw and The Aspern Papers, de Henry James.
«One day it happened that Njal and Thord were sitting together outside. A he-goat had the habit of walking around the hayfield, and no one was allowed to chase it away.
Thord said, "Now this is amazing.".
"What do you see that so amazes you?" said Njal.
"I think I see the goat lying in the hollow over there, all covered with blood."
Njal said there was no goat or anything else ove there.
"What is it, then?" said Thord.
"You must be a doomed man," said Njal, "and you have seen your personal spirit, and now you must be on your guard."
"That won't do me any good," said Thord, "if my fate is sealed."»
And Capa said, "Perhaps you'd like to marry me now?"
She rolled back her head and howled with laughter. "Now you, look!" she said. "If God had consulted the cucumber before he made man, there would be less unhappy women in the world." The whole field roared with laughter at Capa.»
págs.74 e 75
A Russian Journal, de John Steinbeck, com fotografias de Robert Capa.
«In the first weeks the days were long; they often, at their finest, gave me what i used to call my own hour, the hour when, for my pupils, tea-time and bed-time having come and gone, I had before my final retirement a small interval alone. Much as I liked my companions this hour was the thing in the day I liked most; and I liked it best of all when, as the light faded - or rather, I should say, the day lingered and the last calls of the last birds sounded, in a flushed sky, from the old trees - I could take a turn into the grounds and enjoy, almost with a sense of property that amused and flattered me, the beauty and dignity of the place.»
pág.163
The Turn of the Screw and The Aspern Papers, de Henry James.
«One day it happened that Njal and Thord were sitting together outside. A he-goat had the habit of walking around the hayfield, and no one was allowed to chase it away.
Thord said, "Now this is amazing.".
"What do you see that so amazes you?" said Njal.
"I think I see the goat lying in the hollow over there, all covered with blood."
Njal said there was no goat or anything else ove there.
"What is it, then?" said Thord.
"You must be a doomed man," said Njal, "and you have seen your personal spirit, and now you must be on your guard."
"That won't do me any good," said Thord, "if my fate is sealed."»
pág.69
Njal's Saga.
domingo, maio 14, 2006
segunda-feira, maio 01, 2006
Volta à Galiza vol.III: El Baul de Los Recuerdos
sábado, abril 22, 2006
sexta-feira, abril 21, 2006
Volta à Galiza vol.I: Diarios dun nómada - Xavier Queipo
«Oostende (Xusto antes da partida) 26.04.91
I´ve just wake up after a short nap. ¿Que fas falando no teu inglés atrapallado? Acouga. Ninguén está a falar contigo. Ninguén escoita. Estás só no camarote bebendo SPA.
Mal de linguas. Iso é o que tes, en troques de ter mal de mer como outras veces, mesmo antes da partida. E é que ficas como neno con xoguetes novos que non deixarás ata lle remexer nos miolos. É coma un xarampelo idiomático. Empezas por vivir en Bruxelas, capital da Europa occidental e delirio do bilingüísmo, por traballar nun servicio onde tódolos teus colegas falan inglés. Segues por ter un amigo chinés que o mistura co seu inglés internacional, por traballar, agora, nun barco alemán, onde os mariñeiros, pola súa procedencia do leste só falan alemán e ruso. Logo están as túas visitas a Portugal onde les o Público ou O Comércio do Porto ou se estás aburrido falas coa xente no mercado de Santa Apolonia no sábado pola tarde. E as festas, esquecía as festas na casa que Héctor ten na rue Sans-Souci (Precioso xardín con amendoeiros en flor) no que se fala en castelán con sotaque de Tenerife, de Cardiff ou de Vigo. Como remate, e para complica-las cousas estou traducindo un libro de Calvino Collecione di sabia do seu italiano orixinal ó meu galego case inacadémico, no que tamén resolvín escribir estas páxinas e outras. Mal de linguas. Benvido sexa.
Antes de saír escolmo tres versos de Octavio Paz, extraídos do soneto II de Bajo tu clara sombra. Escríboos na cabeceira do meu catre. Eles acompañarán a miña travesía:
«De la suma de instantes en que creces,
del circulo de imágenes del año,
retengo un mes de espumas y de peces.»»
págs. 11 e 12
Na partida, uma das coisas que mais me intrigava era a diferença (e a semelhança) entre as línguas, entre as gentes. À chegada, ficou a sensação de que essa busca exigirá mais viagens, mais descobertas. A literatura, neste primeiro encontro, serve então não só para gozo de si mesma, mas também para gozo da língua em que foi pensada e escrita, e que se quer também entendida.
«Mar aberto (Camiño dos barcos de pesca. Forza sete) 29.04.91
Cando remate esta travesía terei 27 días de vacacións. Día grisallo. Non me encontro ben. Non podo pensar senón no que ha de vir. O presente, só para esquencer.»
pág.14
Diarios dun nómada, de Xavier Queipo, Edicións Positivas, Dezembro de 1993
terça-feira, abril 18, 2006
Adivinha quem voltou
«O guarda ficou a ver Susan afastar-se pelo corredor de cimento. Reparara que os olhos dela, de um belo matiz de avelã, pareciam naquele dia um pouco distantes, mas as faces tinham uma frescura rosada e os cabelos castanhos, que usava pelos ombros, tinham sido recentemente lavados e escovados. Ao passar, deixara atrás de si um ténue cheiro a Johnson's Baby Powder. O olhar do guarda seguiu a linha esbelta do tronco - as alças do soutien quase invisíveis por baixo da blusa branca -, chegou à saia de caqui, pelos joelhos, e deteve-se finalmente nas pernas... as pernas de Susan Fletcher.
Custa a imaginar que transportam um QI de 170, pensou o homem.
Ficou a olhar para ela durante muito tempo. Quando Susan desapareceu ao longe, sacudiu a cabeça.»
pág. 18
sexta-feira, abril 07, 2006
Reinventando Drummond I: Música II
Uma coisa triste no fundo da sala.
Disseram-me que era Chopin.
- «Encantador» – respondi secamente; e recostei-me...
O meu interlocutor falou então de um desgaste quotidiano,
Vaticinou que esta vida é uma porção de deveres,
Estabeleceu metereologias e furores de dentro e fora da alma,
Relacionou sistemas e culturas com os calabouços do Homem,
Argumentou que as estrelas são simples candeeiros esquecidos pelos deuses
Quando há muitos anos se deitaram para dormir para sempre...
Constatando, enfadado, que eu nada dizia,
Perguntou caçoando o bigode o que eu achava...
Eu considerei as contas que era preciso pagar,
Os passos que era preciso dar,
As dificuldades…
Tudo parecia tão pesado,
Tão complexo,
Tão inútil...
O que havia a dizer?
Assim,
Enquaderei o Chopin na minha tristeza
E adormeci,
Deixando ao homem do sonho a responsabilidade de pagar todas as dívidas
E ao meu aborrecido interlocutor
O copo de gin semi-vazio
Que talvez guardasse essa resposta
Que eu não soube
Não quis,
Não pude dar…
Memórias IV: Apontamento Sobre a Verdade Oficial:
(Jaime Cortesão)
(Afonso Costa de acordo com uma caricatura de Rafael Bordalo Pinheiro)
(Manuscrito de Memórias da Grande Guerra [A Primeira] de Jaime Cortesão)
a) – Este é o mais ingénuo… (Afonso Costa ad et apud Jaime Cortesão).
– Agradeço-lhe do coração: Não podia dizer-me palavra mais lisonjeira. (Jaime Cortesão, pelo próprio).
b) Há clarividências tão doentes que só nos vale contra elas o estigma da ingenuidade… (Olho Marinho, 03/12/05)
(Afonso Costa de acordo com uma caricatura de Rafael Bordalo Pinheiro)
(Manuscrito de Memórias da Grande Guerra [A Primeira] de Jaime Cortesão)
a) – Este é o mais ingénuo… (Afonso Costa ad et apud Jaime Cortesão).
– Agradeço-lhe do coração: Não podia dizer-me palavra mais lisonjeira. (Jaime Cortesão, pelo próprio).
b) Há clarividências tão doentes que só nos vale contra elas o estigma da ingenuidade… (Olho Marinho, 03/12/05)
Memórias III: Queixume da alma segundo Rimbaud (Original e tradução):
Memórias I: Do Principezinho... (Uma Lembrança)
Sentiste hoje, Miguel, como estás velho. A conversa era trivial como qualquer conversa quotidiana. Depois alguém quis subir-lhe o interesse. Começou-se a falar de livros, dos melhores, dos eternos. Le Petit Prince de Saint-Exupéry não podia deixar de ser mencionado.
Os que o leram lembraram os melhores momentos; e falaram, é claro, do elefante dentro da jibóia que os adultos, esses cegos confusos que buscam o coração perdido algures no final da infância, não reconheciam. E eu, muito sério, muito atento (como é meu costume), lembrei o desenho com eles. E só vi um chapéu…
E sabes tu, meu espelho, qual foi a pior descoberta? Também eu busco o meu coração que está perdido, e nem sequer o sabia… (Lisboa, 11/04/05)
Os que o leram lembraram os melhores momentos; e falaram, é claro, do elefante dentro da jibóia que os adultos, esses cegos confusos que buscam o coração perdido algures no final da infância, não reconheciam. E eu, muito sério, muito atento (como é meu costume), lembrei o desenho com eles. E só vi um chapéu…
E sabes tu, meu espelho, qual foi a pior descoberta? Também eu busco o meu coração que está perdido, e nem sequer o sabia… (Lisboa, 11/04/05)
quarta-feira, abril 05, 2006
Citizen Kane in Portugal
Culturalmente Correcto, ou como ter Sucesso no mundo da cultura, é a proposta de António Clark Melo que a Mareantes Editora fez chegar às livrarias nestes dias. Aparentemente editado originalmente em inglês sob o título Citizen Kane in Portugal, este livro apresenta-nos uma série de sugestões e conselhos bastante práticos:
«Não é fácil? Vá lá, continue. Pelo menos aqui não seja preguiçoso.
Vire a página e tornar-se-á numa pessoa muito culta!»
"Como se referir a algo de que não sabe nada", "Gostar mais de Umberto Eco do que de outros teóricos lusitanos" e "Os jornais que deve mostrar em público (não precisa de os ler!)" são alguns dos capítulos em que se vão sucedendo referências a escritores, livros, filmes, óperas, destinos turísticos, provérbios e demais artimanhas através das quais é possível passar uma imagem de erudito e de pessoa culta na sociedade portuguesa.
Para mim, encaixa perfeitamente nas definições de "livro de balcão", "ensaio humorístico" e "conjunto de tiradas em que Seinfeld encontra a sociedade cultural portuguesa que podiam muito bem ter sido publicadas em mini-fascículos na revista Os Meus Livros". Tem a graça que tem, e à segunda viagem de comboio já não tem tanta assim.
Mas vale um post, e isso já é qualquer coisa.
«Não é fácil? Vá lá, continue. Pelo menos aqui não seja preguiçoso.
Vire a página e tornar-se-á numa pessoa muito culta!»
pág.8
"Como se referir a algo de que não sabe nada", "Gostar mais de Umberto Eco do que de outros teóricos lusitanos" e "Os jornais que deve mostrar em público (não precisa de os ler!)" são alguns dos capítulos em que se vão sucedendo referências a escritores, livros, filmes, óperas, destinos turísticos, provérbios e demais artimanhas através das quais é possível passar uma imagem de erudito e de pessoa culta na sociedade portuguesa.
Para mim, encaixa perfeitamente nas definições de "livro de balcão", "ensaio humorístico" e "conjunto de tiradas em que Seinfeld encontra a sociedade cultural portuguesa que podiam muito bem ter sido publicadas em mini-fascículos na revista Os Meus Livros". Tem a graça que tem, e à segunda viagem de comboio já não tem tanta assim.
Mas vale um post, e isso já é qualquer coisa.
sábado, abril 01, 2006
Pride and Prejudice
Acabei há uns dias de ler em versão mixada Orgulho e Preconceito de Jane Austen, um livro recomendado por um amigo. Passo a explicar:
O dito cavalheiro emprestou-me um exemplar no original, dando-me o exíguo prazo de 5 dias para o acabar, após o qual iríamos hipoteticamente ao cinema ver o filme com o mesmo título, que está agora nas salas. Ou então ao jardim zoológico. Passados os 5 dias, ia eu na página 2, resolvi dirigir-me à Fnac para dar um avanço aos capítulos. Li umas 50 páginas da tradução portuguesa em meia hora e voltei para casa, para o meu quarto, para a versão original, cheia de entusiasmo e curiosidade. Por volta da página 120, não aguentei mais tanta lentidão e abracei a versão portuguesa, que acabei de um trago.
Jane Austen, criticando sarcasticamente os esquemas e os códigos da sociedade inglesa abastada (also known as burguesia) do século XVIII, provoca no leitor essa vontade universal que é a de cuscar, esse desejo terrível de esmiuçarmos a trica do momento, o acidente que origina a acção, o demónio especulativo que nos escraviza a curiosidade e nos revela a verdadeira miséria que é a da natureza humana.
Ironicamente, Elisabeth, personagem principal, (personagem antípoda à da sua própria mãe), a que aparenta ser mais consciente da sua condição e aquela que nos dá uma visão do mundo que será a mais aproximada da da própria autora, acaba por casar bem, ser o orgulho da sua progenitora e a inveja dos vizinhos.
Casar bem e ser a inveja dos vizinhos é o leitmotiv da acção.
Se o meu inglês fosse melhor, compraria certamente o livro que que encontra na fotografia aqui ao lado. Decerto um excelente manual para o estudo da natureza humana e do seu instinto de sobrevivência.
E para finalizar, servir-me-ei duma expressão que há dias me encheu os olhos no Destak, o jornal que mais leio: "Orgulho e Preconceito" pode de facto ser considerado um estudo sobre alpinismo social.
terça-feira, março 28, 2006
It's Sushi Time!
E porque não falar em livros de culinária?
Em livros de... sushi!
É praticamente Verão, a hora mudou e já muitos andam de manga curta e de sabrina calçada. E como alimentar este estado de espírito?
Com cozido à portuguesa?
Feijoada?
No way. Isso era dantes...
E porque os restaurantes são caríssimos e estamos em tempo de crise... é tempo de aprender a fazer sushi!
Para isso, temos dois excelentes manuais que lhe queremos recomendar:
Para iniciados:
Rápido & Saboroso: sushi, da Gama editora.
Para o nível dois:
Sushi, de Barber, Kiniki e Takemura, Hiroki, da editora Civilização.
Arranje as suas espadas de samurai, vá à praça em busca do peixe fresquinho (pode tentar alguns supermercados de renome, mas assim é mais giro), vasculhe os bazares orientais (sim, esses que são às dúzias na sua rua), e deite mãos à obra... mas tenha cuidado para não as decepar.
Finalmente, enjoy! (ou como dizem os japoneses, "Mnham, mnham!")
Ass: Cristina e Helena
quinta-feira, março 23, 2006
Título do Ano 2006: 1ª nomeação
Como Ganhar Uma Fortuna dos Diabos e Ainda Assim Ir Para o Céu, no original, How to Make One Hell of a Profit and Still Get to Heaven, de John Demartini, foi editado recentemente pela editora Pergaminho, inserido na colecção Desenvolvimento Pessoal.
Na apresentação pode ler-se «Este livro vai ajudá-lo a atingir os seus objectivos financeiros, pois apresenta uma forma totalmente nova de compreender e visualizar a natureza dos bens materiais. Os princípios e metodologias aqui explicados permitir-lhe-ão desenvolver uma relação saudável com a riqueza material – e espiritual – que está sempre ao seu alcance».
Mais informação sobre o livro e o autor no seu site pessoal, em drdemartini.com, onde se pode encontrar na página inicial um dos segredos para ganhar uma fortuna dos diabos: «Do you desire to achieve your full potential? Well, now you can through the purchase of Dr. Demartini's books, CDs, & DVDs.»
Sugestões para os próximos nomeados poderão ser enviadas para o e-mail acima.
Boas leituras :)
Na apresentação pode ler-se «Este livro vai ajudá-lo a atingir os seus objectivos financeiros, pois apresenta uma forma totalmente nova de compreender e visualizar a natureza dos bens materiais. Os princípios e metodologias aqui explicados permitir-lhe-ão desenvolver uma relação saudável com a riqueza material – e espiritual – que está sempre ao seu alcance».
Mais informação sobre o livro e o autor no seu site pessoal, em drdemartini.com, onde se pode encontrar na página inicial um dos segredos para ganhar uma fortuna dos diabos: «Do you desire to achieve your full potential? Well, now you can through the purchase of Dr. Demartini's books, CDs, & DVDs.»
Sugestões para os próximos nomeados poderão ser enviadas para o e-mail acima.
Boas leituras :)
sábado, março 18, 2006
Zapping: Livros Difíceis
«Em 1597, Miguel de Cervantes foi preso em Sevilha, porque tinha algumas dívidas. Foi na prisão, onde permaneceu por três meses, que começou a escrever Dom Quixote de la Mancha.»
sábado, março 11, 2006
"era bonito ver, aqui no Saldanha, chover Montanhas Mágicas"
«Dois dias de viagem apartam um homem - e especialmente um jovem que ainda não criou raízes firmes na vida - do seu mundo quotidiano, de tudo quanto costuma considerar os seus interesses, cuidados e projectos; apartam-no muito mais do que esse jovem imaginava no fiacre que o levava à estação. O espaço que, girando e fugindo, se punha de permeio entre ele e a estação de origem, desenrolou forças que geralmente se julgam privilégio do tempo; de hora em hora o espaço determina transformações íntimas, muito parecidas com aquelas que o tempo origina, mas que, de certo modo, as ultrapassam.
Tal qual o tempo, o espaço gera o olvido; fá-lo porém, desligando a pessoa humana das suas contingências e pondo-a num estado livre, primitivo; chega até mesmo a transformar, num só golpe, um pedante ou um burguesote numa espécie de vagabundo. Dizem que o tempo é como o rio Lete; mas também o ar de paragens longínquas representa uma poção semelhante, e o seu efeito, posto que menos radical, não deixa de ser mais rápido.»
Depois de uma busca de vários meses, eis que de repente começaram a aparecer exemplares da Montanha Mágica: dois deles em segunda mão, de um vendedor que não tinha bem a noção dos livros que tinha, e outro ainda novo, duma livraria do Entroncamento que não o tinha conseguido vender... Nas conversas que se têm seguido, imaginámos: "era bonito ver, aqui no Saldanha, chover Montanhas Mágicas".
Esta imagem é do exemplar que ficou cá em casa, que para além do distinto cheiro a velho, tem uma dedicatória de 23/12/1958.
Na próxima tertúlia já teremos mais exemplares :)
Tal qual o tempo, o espaço gera o olvido; fá-lo porém, desligando a pessoa humana das suas contingências e pondo-a num estado livre, primitivo; chega até mesmo a transformar, num só golpe, um pedante ou um burguesote numa espécie de vagabundo. Dizem que o tempo é como o rio Lete; mas também o ar de paragens longínquas representa uma poção semelhante, e o seu efeito, posto que menos radical, não deixa de ser mais rápido.»
pág.8
Depois de uma busca de vários meses, eis que de repente começaram a aparecer exemplares da Montanha Mágica: dois deles em segunda mão, de um vendedor que não tinha bem a noção dos livros que tinha, e outro ainda novo, duma livraria do Entroncamento que não o tinha conseguido vender... Nas conversas que se têm seguido, imaginámos: "era bonito ver, aqui no Saldanha, chover Montanhas Mágicas".
Esta imagem é do exemplar que ficou cá em casa, que para além do distinto cheiro a velho, tem uma dedicatória de 23/12/1958.
Na próxima tertúlia já teremos mais exemplares :)
quinta-feira, março 09, 2006
Montra...
Pois, isto é quando se pode e não quando se quer. A ideia foi boa, mas quando o tempo não estica... Por aqui vamos falando de livros e tudo o resto, estejam eles na montra ou não...
«no papel, as palavras escondidas, as nuvens.
dizes não posso ser o mundo hoje, esqueces que
tu és o mundo. dizes não posso, e eu gostava que
soubesses sempre que um lamento dentro de mim
te repete. abro o papel dobrado e abro a noite
no céu. as árvores são distantes, as palavras
e talvez a música, a terra é distante no
papel dobrado que me entregas escondido
na mão.»
A Criança em Ruínas, de José Luís Peixoto, editado pela Quasi em Setembro de 2001 (5ª edição, Novembro de 2003).
NO AZUL ÁRABE DE SAMARCANDA
«Um domingo, no azul árabe de Samrcanda, Amid Aka viu caminhar ao seu encontro dois forasteiros. Vinham ao fundo da avenida e, seguramente, procuravam chegar à sua loja, famosa pelas melancias que se comem durante o tempo em que as areias de deslocam. Num dado momento, os dois viraram em direcção do seu alpendre de madeira que cobre, de sombra, algumas mesas. No lavatório, apoiado contra o muro externo, lavaram as mãos. Amid Aka foi buscar duas melancias à loja fresca. Quando regressou, sob o alpendre, viu que um dos dois homens já não estava. Ao pousar as melancias, diante do que ficara, pergunta-lhe a razão pela qual seu amigo se ausentara. O homem fixou-o, com o rosto envolto numa expressão de perda. Limpou a fronte, coberta por gotas de suor, e, exausto, levantou-se da mesa dando sinais de partir. Mas antes disse: «Desde há algum tempo que todos me vêem na companhia de alguém». E afastou-se, pesaroso, caminhando ao longo da avenida coberta de pó.»
Histórias para uma Noite de Calmaria (Il Polverone - Storie per una Notte Quieta), de Tonino Guerra (tradução de Mário Rui de Oliveira), editado pela Assírio & Alvim em Novembro de 2002.
«no papel, as palavras escondidas, as nuvens.
dizes não posso ser o mundo hoje, esqueces que
tu és o mundo. dizes não posso, e eu gostava que
soubesses sempre que um lamento dentro de mim
te repete. abro o papel dobrado e abro a noite
no céu. as árvores são distantes, as palavras
e talvez a música, a terra é distante no
papel dobrado que me entregas escondido
na mão.»
pág. 79
A Criança em Ruínas, de José Luís Peixoto, editado pela Quasi em Setembro de 2001 (5ª edição, Novembro de 2003).
NO AZUL ÁRABE DE SAMARCANDA
«Um domingo, no azul árabe de Samrcanda, Amid Aka viu caminhar ao seu encontro dois forasteiros. Vinham ao fundo da avenida e, seguramente, procuravam chegar à sua loja, famosa pelas melancias que se comem durante o tempo em que as areias de deslocam. Num dado momento, os dois viraram em direcção do seu alpendre de madeira que cobre, de sombra, algumas mesas. No lavatório, apoiado contra o muro externo, lavaram as mãos. Amid Aka foi buscar duas melancias à loja fresca. Quando regressou, sob o alpendre, viu que um dos dois homens já não estava. Ao pousar as melancias, diante do que ficara, pergunta-lhe a razão pela qual seu amigo se ausentara. O homem fixou-o, com o rosto envolto numa expressão de perda. Limpou a fronte, coberta por gotas de suor, e, exausto, levantou-se da mesa dando sinais de partir. Mas antes disse: «Desde há algum tempo que todos me vêem na companhia de alguém». E afastou-se, pesaroso, caminhando ao longo da avenida coberta de pó.»
pág. 82
Histórias para uma Noite de Calmaria (Il Polverone - Storie per una Notte Quieta), de Tonino Guerra (tradução de Mário Rui de Oliveira), editado pela Assírio & Alvim em Novembro de 2002.
sábado, fevereiro 11, 2006
Apresentação da Noite - Al Berto
- é noite
- dentro do meu coração de papel
- é noite
- dissolve-se um desastre um inesperado suicídio
- é noite por cima do mar redondo
- é noite
- em redor da memória que me dá sede
- é noite
- calemo-nos um momento
- calemo-nos
- calemo-nos todos
- vai chegar o inverno
- acendamos as luzes e olhemo-nos como fazem determinadas flores ao morrer do dia
- dobram-se para dentro da seiva e cismam
- um sono de ave que só a elas pertence
- esqueçamos também o tempo
- que se ilumine o coral e se abram de par em par as pálpebras exaustas do medo
- são horas de alucinação
- horas de janelas abertas
- horas amor
- de fingir que nos amámos
Apresentação da Noite foi originalmente publicada em 1985, "incluída no volume de textos para teatro Novos Autores, nº 32 da colecção Repertório da Sociedade Portuguesa de Autores", nos 60 anos dessa cooperativa. Foi representada pela primeira vez no dia 25 de Fevereiro de 1985, no Auditório Frederico Freitas. E chegou esta semana novamente às livrarias, pela mão da Assírio & Alvim.
«Apresentação da Noite nasceu, a um dado momento, da necessidade de tornar audível esse silêncio onde se perde todo e qualquer desejo de escrever.»
- dentro do meu coração de papel
- é noite
- dissolve-se um desastre um inesperado suicídio
- é noite por cima do mar redondo
- é noite
- em redor da memória que me dá sede
- é noite
- calemo-nos um momento
- calemo-nos
- calemo-nos todos
- vai chegar o inverno
- acendamos as luzes e olhemo-nos como fazem determinadas flores ao morrer do dia
- dobram-se para dentro da seiva e cismam
- um sono de ave que só a elas pertence
- esqueçamos também o tempo
- que se ilumine o coral e se abram de par em par as pálpebras exaustas do medo
- são horas de alucinação
- horas de janelas abertas
- horas amor
- de fingir que nos amámos
de Al Berto
Apresentação da Noite foi originalmente publicada em 1985, "incluída no volume de textos para teatro Novos Autores, nº 32 da colecção Repertório da Sociedade Portuguesa de Autores", nos 60 anos dessa cooperativa. Foi representada pela primeira vez no dia 25 de Fevereiro de 1985, no Auditório Frederico Freitas. E chegou esta semana novamente às livrarias, pela mão da Assírio & Alvim.
«Apresentação da Noite nasceu, a um dado momento, da necessidade de tornar audível esse silêncio onde se perde todo e qualquer desejo de escrever.»
diz Al Berto, na introdução
sexta-feira, fevereiro 10, 2006
Montra: semana 06/06 - parte 2
«If you want to read what is absolutely, certainly true about Mozart, this book may be a disappointment, because the story of what has happened to him since his death has irretrievably coloured that simple tale. But at the moment that marks a quarter of millenium since Mozart was born, the most we can do, given the infinite variety of possibilities in his music, is to provide some context - to help us hear Mozart's music freshly, and make of it what we will. Each listener will have a different reaction, just as every performer reinterprets him: here are some guides around that amazing output; from them, create your own Mozart.»
«Mozart is like a mistress who is always serious and often sad, but whose very sadness is a fascination, discovering ever deeper springs of love.»
The Faber Pocket Guide to Mozart, de Nicholas Kenyon, editado pela Faber & Faber em Setembro de 2005.
«- Parece-me que o senhor não percebeu mas acontece que não me apetece falar consigo.
- Porquê? - perguntou o desconhecido, num tom desenvolto.
- Porque estou a ler.
- Não está, não.
- Desculpe?
- O senhor não está a ler. Talvez pense que está a ler mas leitura não é isso.
- Oiça, não me apetece mesmo nada ouvir considerações profundas acerca da leitura. O senhor irrita-me. Mesmo que não estivesse a ler, não ia querer falar consigo.
- Vê-se logo quando alguém está a ler. As pessoas que lêem, que lêem a sério, não estão aqui. E o senhor está aqui.
- Nem imagina como lamento estar aqui! Sobretudo desde que o senhor apareceu.
- Pois é, a vida é cheia destes pequenos desacertos que a tornam complicada. Mais do que os problemas metafísicos, são as contrariedades insignificantes que marcam o absurdo da existência.»
A Cosmética do Inimigo (Cosmétique de l'ennemi), de Amélie Nothomb (trad. Fernanda Barão), editado pela Bizâncio em Maio de 2002.
«Que brando jeito aquele: como se sorrisse perante a agitação, a fantasia, a loucura e a graça de um grupo de crianças que brinca. Mas do que eu gostava sobretudo era da repousada segurança com que Teresinha cruzava as mãos sobre o vestido; ali, conversando e ouvindo as outras, e as mãos cruzadas, descansando uma na outra, como se apenas em si mesmas pudessem repousar.
Como nos conhecíamos de um ou dois domingos em que a tinha esperado com Carlinhos, fazia-lhe um cumprimento e passava. As outras tinham quase sempre um ar que se ligava ao da manhã, mais parado e melancólico nos de chuvinha e nevoeiro ou a um tempo arrepiado e vivo naquele agudo frio de céu azul que o Porto dá às vezes. Mas as mais bonitas para as ver eram as manhãs de Abril: não por elas, devo dizer; mas porque me davam um excelente fundo de lembrança que me tornava mais alegre e audacioso o voo riscado das andorinhas sobre o céu. Mulher complica a vida da gente, não é? O que não sucede com as andorinhas.»
Herta Teresinha Joan, de Agostinho da Silva, editado pela Cotovia em Maio de 1990.
pág.4
«Mozart is like a mistress who is always serious and often sad, but whose very sadness is a fascination, discovering ever deeper springs of love.»
Stendhal (pág. 15)
The Faber Pocket Guide to Mozart, de Nicholas Kenyon, editado pela Faber & Faber em Setembro de 2005.
«- Parece-me que o senhor não percebeu mas acontece que não me apetece falar consigo.
- Porquê? - perguntou o desconhecido, num tom desenvolto.
- Porque estou a ler.
- Não está, não.
- Desculpe?
- O senhor não está a ler. Talvez pense que está a ler mas leitura não é isso.
- Oiça, não me apetece mesmo nada ouvir considerações profundas acerca da leitura. O senhor irrita-me. Mesmo que não estivesse a ler, não ia querer falar consigo.
- Vê-se logo quando alguém está a ler. As pessoas que lêem, que lêem a sério, não estão aqui. E o senhor está aqui.
- Nem imagina como lamento estar aqui! Sobretudo desde que o senhor apareceu.
- Pois é, a vida é cheia destes pequenos desacertos que a tornam complicada. Mais do que os problemas metafísicos, são as contrariedades insignificantes que marcam o absurdo da existência.»
págs. 9 e 10
A Cosmética do Inimigo (Cosmétique de l'ennemi), de Amélie Nothomb (trad. Fernanda Barão), editado pela Bizâncio em Maio de 2002.
«Que brando jeito aquele: como se sorrisse perante a agitação, a fantasia, a loucura e a graça de um grupo de crianças que brinca. Mas do que eu gostava sobretudo era da repousada segurança com que Teresinha cruzava as mãos sobre o vestido; ali, conversando e ouvindo as outras, e as mãos cruzadas, descansando uma na outra, como se apenas em si mesmas pudessem repousar.
Como nos conhecíamos de um ou dois domingos em que a tinha esperado com Carlinhos, fazia-lhe um cumprimento e passava. As outras tinham quase sempre um ar que se ligava ao da manhã, mais parado e melancólico nos de chuvinha e nevoeiro ou a um tempo arrepiado e vivo naquele agudo frio de céu azul que o Porto dá às vezes. Mas as mais bonitas para as ver eram as manhãs de Abril: não por elas, devo dizer; mas porque me davam um excelente fundo de lembrança que me tornava mais alegre e audacioso o voo riscado das andorinhas sobre o céu. Mulher complica a vida da gente, não é? O que não sucede com as andorinhas.»
págs. 50 e 51
Herta Teresinha Joan, de Agostinho da Silva, editado pela Cotovia em Maio de 1990.
segunda-feira, fevereiro 06, 2006
Montra: semana 06/06
Segunda semana de montra, com um dia de atraso e incompleta.
PERDIDO NUM LIVRO
«Entrei pela porta de um livro e fechei-me lá dentro com as palavras acesas e as luzes apagadas. A minha mãe deu dez voltas à casa à minha procura. "Onde é que o miúdo se terá metido?" Com medo de ser encontrado, eu saltava das páginas pares para as ímpares e enrodilhava-me, feito bicho-de-conta, entre dois parêntesis ou, por ser muito magro, atrás de um ponto de exclamação.
Era a primeira vez na minha vida que eu me fechava dentro de um livro. Antes já me fechara dentro de um armário, na gaveta de uma cómoda, no sótão e na despensa. Agora, afoito e insensato, dava um passo de gigante no meu aventuroso destino de menino dos assombros, e escondia-me dentro de um livro, disposto a permanecer ali o tempo que fosse necessário até a minha mãe desistir de me procurar e até todos me darem definitiva e irremediavelmente como desparecido.
(...)»
Antologia do Conto Português Contemporâneo (edição bilingue Português-Búlgaro) / Антология на съвременния португалски разказ, organizado por Petar Petrov, editado pela Five Plus / Пет плюс.
«O papá é livreiro. Adora os livros. Devora-os. É um verdadeiro ogre. Passa todo o dia a ler e às vezes toda a noite. É uma doença incurável, mas que não parece preocupar o nosso médico de família.
Todas as noites, uma nova pilha de livros desembarca lá em casa. Há livros por toda a parte, até nas casas de banho. É uma invasão. Impossível reclamar. Com o papá, os invasores têm sempre razão. Fala com eles como se fossem seres humanos. Inventa nomes para eles e trata-os por «os meus livrinhos». Todos os livros são seus amigos.
Eu não tenho amigos. E não gosto de livros. Por fora, sou parecido com o papá. Mas por dentro, somos dois estranhos.
(...)»
O bebedor de tinta (Le buveur d'encre), de Éric Sanvoisin e Martin Matje (traduzido por Sofia Empis), editado pela Dinalivro.
HARMÓNICA
«Um músico italiano (ele era da Sicília) escreveu algumas óperas belíssimas: "O Corsário", inspirada num poema de Byron, "A Sonâmbula", etc. Certo dia disse aos amigos:
"Ainda hei-de escrever uma ópera que nos lembre a estupidez e a crueldade humanas." Logo na abertura, o conseguiu. Tinha menos de 30 anos.
Mas que distância há entre um rapaz desses e o nosso repetido Lopes Graça!
Vou comprar outra gaita de beiços. Rádios, nunca mais. Avariam-se todos, pá.»
Hoje e sempre, Sebastião Alba.
Albas, de Sebastião Alba, editado pela Quasi em Outubro de 2003.
«(...)
O sorriso que devassou brevemente o meu rosto não
me pertenceu: porque ninguém o viu antes de ti,
nem o espelho se convenceu jamais a devolver-mo.
(...)
Tu não me pertenceste - e, se uma vez acreditei que
acontecias dentro do meu corpo, das outras vi-te a abraçar a
solidão com tanto ardor que concluí ser a memória quem
te mantinha vivo. (...)»
O Canto do Vento nos Ciprestes, de Maria do Rosário Pedreira, foi editado pela Gótica em Março de 2001.
PERDIDO NUM LIVRO
«Entrei pela porta de um livro e fechei-me lá dentro com as palavras acesas e as luzes apagadas. A minha mãe deu dez voltas à casa à minha procura. "Onde é que o miúdo se terá metido?" Com medo de ser encontrado, eu saltava das páginas pares para as ímpares e enrodilhava-me, feito bicho-de-conta, entre dois parêntesis ou, por ser muito magro, atrás de um ponto de exclamação.
Era a primeira vez na minha vida que eu me fechava dentro de um livro. Antes já me fechara dentro de um armário, na gaveta de uma cómoda, no sótão e na despensa. Agora, afoito e insensato, dava um passo de gigante no meu aventuroso destino de menino dos assombros, e escondia-me dentro de um livro, disposto a permanecer ali o tempo que fosse necessário até a minha mãe desistir de me procurar e até todos me darem definitiva e irremediavelmente como desparecido.
(...)»
de José Jorge Letria
Antologia do Conto Português Contemporâneo (edição bilingue Português-Búlgaro) / Антология на съвременния португалски разказ, organizado por Petar Petrov, editado pela Five Plus / Пет плюс.
«O papá é livreiro. Adora os livros. Devora-os. É um verdadeiro ogre. Passa todo o dia a ler e às vezes toda a noite. É uma doença incurável, mas que não parece preocupar o nosso médico de família.
Todas as noites, uma nova pilha de livros desembarca lá em casa. Há livros por toda a parte, até nas casas de banho. É uma invasão. Impossível reclamar. Com o papá, os invasores têm sempre razão. Fala com eles como se fossem seres humanos. Inventa nomes para eles e trata-os por «os meus livrinhos». Todos os livros são seus amigos.
Eu não tenho amigos. E não gosto de livros. Por fora, sou parecido com o papá. Mas por dentro, somos dois estranhos.
(...)»
págs. 7 e 8
O bebedor de tinta (Le buveur d'encre), de Éric Sanvoisin e Martin Matje (traduzido por Sofia Empis), editado pela Dinalivro.
HARMÓNICA
«Um músico italiano (ele era da Sicília) escreveu algumas óperas belíssimas: "O Corsário", inspirada num poema de Byron, "A Sonâmbula", etc. Certo dia disse aos amigos:
"Ainda hei-de escrever uma ópera que nos lembre a estupidez e a crueldade humanas." Logo na abertura, o conseguiu. Tinha menos de 30 anos.
Mas que distância há entre um rapaz desses e o nosso repetido Lopes Graça!
Vou comprar outra gaita de beiços. Rádios, nunca mais. Avariam-se todos, pá.»
pág. 146
Hoje e sempre, Sebastião Alba.
Albas, de Sebastião Alba, editado pela Quasi em Outubro de 2003.
«(...)
O sorriso que devassou brevemente o meu rosto não
me pertenceu: porque ninguém o viu antes de ti,
nem o espelho se convenceu jamais a devolver-mo.
(...)
Tu não me pertenceste - e, se uma vez acreditei que
acontecias dentro do meu corpo, das outras vi-te a abraçar a
solidão com tanto ardor que concluí ser a memória quem
te mantinha vivo. (...)»
pág. 63
O Canto do Vento nos Ciprestes, de Maria do Rosário Pedreira, foi editado pela Gótica em Março de 2001.
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