- dentro do meu coração de papel
- é noite
- dissolve-se um desastre um inesperado suicídio
- é noite por cima do mar redondo
- é noite
- em redor da memória que me dá sede
- é noite
- calemo-nos um momento
- calemo-nos
- calemo-nos todos
- vai chegar o inverno
- acendamos as luzes e olhemo-nos como fazem determinadas flores ao morrer do dia
- dobram-se para dentro da seiva e cismam
- um sono de ave que só a elas pertence
- esqueçamos também o tempo
- que se ilumine o coral e se abram de par em par as pálpebras exaustas do medo
- são horas de alucinação
- horas de janelas abertas
- horas amor
- de fingir que nos amámos
de Al Berto
Apresentação da Noite foi originalmente publicada em 1985, "incluída no volume de textos para teatro Novos Autores, nº 32 da colecção Repertório da Sociedade Portuguesa de Autores", nos 60 anos dessa cooperativa. Foi representada pela primeira vez no dia 25 de Fevereiro de 1985, no Auditório Frederico Freitas. E chegou esta semana novamente às livrarias, pela mão da Assírio & Alvim.
«Apresentação da Noite nasceu, a um dado momento, da necessidade de tornar audível esse silêncio onde se perde todo e qualquer desejo de escrever.»
diz Al Berto, na introdução
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