DON’T SMOKE IN BED
depois de ter relido Música Antológica & Onze Cidades
Lembro-me que era Inverno,
numa aldeia do Ribatejo
que me conheceu demasiado bem.
Surpreendi-me. Nunca tinha visto
tanto charro, tanta música em comum,
na “jovem poesia portuguesa”
- esse frouxo refrão do sangue (se
não mesmo inodoro, a alugar vertigens).
Era eu inédito, desolado. Cultivava o desamor.
Apeteceu-me escrever. Escrever-te.
Mas as palavras demoram às vezes anos
a chegar - e nem por isso nos dão
a garantia de serem necessárias.
Gesto, tolhido, que vai ou não vai
ter ao coração do coração. Tu sabes,
depois do pequeno inferno,
quando já não somos jovens.
Não tinha, nunca terei, canções.
Sei apenas que é de novo Inverno
e que passaram alguns anos,
num bairro tão perto de Lisboa
como o dedo do gatilho ou
a palavra do chão. Ouço Nina
Simone, espero que não te importes,
e pergunto cada vez menos
pelas artérias do lirismo nacional.
O dia, coalhado, vem de onde
não quero. E acho que mudei um pouco,
como tudo. Até fumo por semana
menos charros do que os livros
que entretanto publiquei. De ti,
obviamente, nada mais pude saber.
Chega até de nós, de mansinho, o último livro de Manuel de Freitas. “Blues for Mary Jane”, editado pela &etc, traz-nos este “Don’t Smoke in Bed” e outras memórias tristes, mas sempre bonitas.
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