Ensaios Facetos, de Abel Barros Baptista, Livros Cotovia, Ensaio, 148 pp., preço de capa: 12,00 Euros
Em sentido muito lato, chama-se faceto ao que não é sério: um ensaio pode ser faceto sem nada perder de essencial? Sendo análise, averiguação, exame, indagação, procura, o ensaio ganha se além disso for brincalhão ou galhofeiro, gozador ou jocoso, pilhérico ou zombeteiro?
Os textos que compõem este livro acreditam no ensaio genuinamente faceto e, em modalidades diversas, ilustram a possibilidade de o estruturar segundo um princípio de galhofa. A defesa do sentido de humor é hoje uma trivialidade. Mas hoje também, uma batalha provavelmente perdida: a “opinião”, que se basta em ser plausível, prefere o sisudo e aliás confunde-o com profundidade. O humor então prejudica, porque divide, corrói evidências, sugere alternativas, abala familiaridades. Daí que o ensaio, algumas vezes, só se torne ensaio por meio de facécia.
Abel Barros Baptista nasceu em 1955. Professor da Universidade Nova de Lisboa, publicou diversos ensaios literários (entre os mais recentes: Autobibliografias, 1998, Grande Prémio de Ensaio Literário da APE, A Infelicidade pela Bibliografia, 2001 e Coligação de Avulsos, 2003). Organizou o volume A Cidade e as Serras. Uma Revisão (2002). É director-adjunto da revista Colóquio/Letras. Publicou, com Gustavo Rubim, o romance Importa-se de me emprestar o barroco? (2003).
O Vôo da Madrugada, de Sérgio Sant’Anna, Livros Cotovia, Ficção Brasileira, 240 pp., preço de capa: 14,00 Euros
Sérgio Sant’Anna nasceu no Rio de Janeiro em 1941. É autor de, entre outros livros: O concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro, Junk-Box, A senhorita Simpson, Breve história do espírito, O monstro, e Um crime delicado. Foi distinguido com três prémios Jabuti. O Vôo da Madrugada (publicado no Brasil em Setembro de 2003) recebeu o prémio de conto da Associação de Críticos de Arte de São Paulo e é o livro que inaugura a edição em Portugal deste autor.
Notória na obra de Sérgio Sant’Anna, a experimentação formal apresenta-se aqui na tentativa de realizar um conto abstracto, na exploração de temas obscuros, no impulso criativo depois de um internamento hospitalar ou na esperança de uma personagem – o Gorila – em encontrar estratégias inusuais, e incompreendidas, de comunicação e consolo. A solidão persegue as personagens destes contos de forma desesperada, a ponto de fazê-las pensar em pôr termo à existência; essa obsessão pelo desfecho da vida associa-se a uma forte carga erótica.
Os contornos inovadores desta escrita são dados pela oscilação entre a voz do narrador e do próprio escritor, como acontece nas belas invocações da memória do autor ou nos três magníficos contos finais, em que ficção e ensaio se conjugam para especular sobre o papel do olhar na representação da nudez da mulher na pintura, defendendo uma arte ligada de forma íntima à vida.
textos de promoção aos livros, divulgados pela Livros Cotovia
...e também não é por roubar um pássaro ou um livro, que logo dá aos amigos, que o Alba tem as mãos sujas. chartapaciu@gmail.com
quinta-feira, abril 29, 2004
segunda-feira, abril 26, 2004
Feira do Livro Barato, em Cascais até 2 de Maio
Já aberta ao público desde o passado dia 22, a Feira do Livro Barato de Cascais decorre até ao próximo Domingo, das 15h às 22h.
A Feira que em anos passados se realizou numa tenda instalada no Jardim Visconde da Luz, passou este ano para a Cidadela de Cascais, por determinação da Câmara Municipal, que ali quer implementar um novo centro cultural.
Mais uma vez organizada pela Solipa, nesta Feira pode encontrar-se uma grande variedade de livros nacionais e estrangeiros, entre saldos, fins de edição e novidades.
A Feira que em anos passados se realizou numa tenda instalada no Jardim Visconde da Luz, passou este ano para a Cidadela de Cascais, por determinação da Câmara Municipal, que ali quer implementar um novo centro cultural.
Mais uma vez organizada pela Solipa, nesta Feira pode encontrar-se uma grande variedade de livros nacionais e estrangeiros, entre saldos, fins de edição e novidades.
domingo, abril 25, 2004
o problema do sexo
«Para um homem da sua idade, cinquenta e dois anos, tem resolvido bastante bem, segundo ele, o problema do sexo. Nas tardes de quinta-feira vai de carro até Green Point. Pontualmente, às duas da tarde, carrega na campainha da entrada para a Windsor Mansions, diz o nome e entra. À sua espera, à porta do 113, está Soraya. Dirige-se directamente para o quarto, que tem um cheiro agradável e uma iluminação suave, e despe-se. Soraya da casa de banho, deixa cair o robe e, deslizante, deita-se na cama a seu lado. - Tiveste saudades minhas? - pergunta ela. - Tenho sempre saudades tuas - responde ele. Acaricia-lhe o corpo cor de mel no qual o sol não deixou marca; estende-a e beija-lhe os seios; fazem amor.»
É só a mim que este 1º capítulo de "Desgraça", de J. M. Coetzee, faz lembrar o filme "Intimidade", de Patrice Chéreau?
É só a mim que este 1º capítulo de "Desgraça", de J. M. Coetzee, faz lembrar o filme "Intimidade", de Patrice Chéreau?
sexta-feira, abril 23, 2004
FEIRA DO LIVRO DE COIMBRA até 9 de Maio
Desde ontem que decorre mais uma edição da Feira do Livro de Coimbra, e que irá estar aberta ao público até ao próximo dia 9.
A Feira é constituída por 53 expositores, que entre si disponibilizam milhares de livros de 250 editoras, nacionais e estrangeiras.
Estão previstas também algumas actividades paralelas, como a realização de concertos, e no dia 1 de Maio haverá poesia na baixa da cidade, com poetas a declamar os seus poemas pelas ruas e cafés.
Localização: Rua Engº Jorge Anjinho, na Solum.
Horário:
Domingo a 5ª feira - das 15h às 23h
6ª feira e Sábado - das 15h às 24h
A Feira é constituída por 53 expositores, que entre si disponibilizam milhares de livros de 250 editoras, nacionais e estrangeiras.
Estão previstas também algumas actividades paralelas, como a realização de concertos, e no dia 1 de Maio haverá poesia na baixa da cidade, com poetas a declamar os seus poemas pelas ruas e cafés.
Localização: Rua Engº Jorge Anjinho, na Solum.
Horário:
Domingo a 5ª feira - das 15h às 23h
6ª feira e Sábado - das 15h às 24h
quarta-feira, abril 21, 2004
BRAM STOKER (1847 - 1912)
Count Vlad, Bram Stoker e Henry Irving
Bram Stoker morreu aos 64 anos de idade, fez ontem 92 anos. Apesar de ser o autor de uma dúzia de romances, três colecções de contos e quatro livros não ficcionais, Stoker é conhecido quase exclusivamente por Dracula, publicado em 1897. O romance trouxe pouca fama ou fortuna a Stoker durante a sua vida, e no último ano ele ganhou tão pouco com a sua escrita que teve de se candidatar a um piedoso subsídio ao Fundo Literário Real. Nem a violência erótica do livro levantou sobrancelhas, apesar de Ghosts, de Ibsen, que foi publicado nesse mesmo ano e era muito mais suave, ter causado furor por abordar o tema das doenças venéreas. Os críticos da época, talvez relutantes em denotar o subtexto psicossexual com medo da auto-condenação, optaram por classificar Dracula como uma obra popular, de objectivos comerciais; os críticos contemporâneos lêem o livro como um “léxico sexual genuíno de tabus Victorianos”, ou como “uma espécie de desafio de wrestling incestuoso, necrófilo, oral-anal-sadístico, tudo misturado”, ou “sexo sem genitais, sexo sem confusão, sexo sem responsabilidade, sexo sem culpa, sexo sem amor - melhor ainda, sexo sem qualquer registo”.
Ondas de histeria vampírica varreram a Europa ao longo do Séc. XVIII, e na altura em que Stoker teve a sua vez com as lendas, já elas tinham sido trabalhadas por Goethe, Coleridge, Byron, Southey, Dumas e outros. O primeiro romance Inglês da linha vampírica foi The Vampire, de John Polidori, escrito em 1819, a partir do fragmento de uma história desenvolvida por Byron, de quem Polidori era médico particular. (O romance de Polidori é por demais relembrado como a resposta a uma das clássicas perguntas em jogos de conhecimento literário: Qual foi a outra história de terror que teve a sua génese na noite literária do Lago Genebra partilhada por Byron e pelos Shelleys?) Apesar de haver um subtexto de sexualidade reprimida, confusa e depravada em muita da literatura de vampiros, alguns biógrafos acreditam que o interesse de Stoker no tema veio menos das lendas do que da sua vida privada, especificamente da sua complexa relação com o famoso actor Henry Irving. Stoker era o agente e companheiro de há longa data de Irving, apaixonado ao ponto de ponto de ter dado ao seu filho o nome de Irving Noel Stoker. Dracula, nesta linha de raciocínio, é uma miscelânea de transferência homoerótica.
Mais tradicional e menos subliminar é a ideia de que o herói de Stoker deriva da sua pesquisa de um príncipe de Wallachia (antigo principado, agora anexado na Roménia) do Séc. XV, Conde Vlad Tepes, ou Vlad o Empalador, filho de Vlad Dracul. Esta ligação é aparentemente errónea: Stoker ia chamar ao seu romance “Conde Wampyr” até à sua pesquisa o ter levado a acreditar, não muito correctamente, que «Dracula» significava «Demónio» na língua Wallachiana. Daí, embora o autor conhecesse pouco ou nada do histórico Vlad, ou da Transilvânia, o livro levou a que ambos fossem consumidos pelo império vampírico. Até há alguns anos atrás, o governo Romeno tinha planos para construir o “Parque Drácula” na cidade medieval de Sighisoara, local de nascimento do Conde Vlad; protestos de estudiosos do vampirismo, defensores da história Romena e activistas anti-Disney levaram a que o projecto fosse mudado para a zona de Bucareste.
Adaptado de um texto de Steve King, publicado no Today in Literature.
Bram Stoker morreu aos 64 anos de idade, fez ontem 92 anos. Apesar de ser o autor de uma dúzia de romances, três colecções de contos e quatro livros não ficcionais, Stoker é conhecido quase exclusivamente por Dracula, publicado em 1897. O romance trouxe pouca fama ou fortuna a Stoker durante a sua vida, e no último ano ele ganhou tão pouco com a sua escrita que teve de se candidatar a um piedoso subsídio ao Fundo Literário Real. Nem a violência erótica do livro levantou sobrancelhas, apesar de Ghosts, de Ibsen, que foi publicado nesse mesmo ano e era muito mais suave, ter causado furor por abordar o tema das doenças venéreas. Os críticos da época, talvez relutantes em denotar o subtexto psicossexual com medo da auto-condenação, optaram por classificar Dracula como uma obra popular, de objectivos comerciais; os críticos contemporâneos lêem o livro como um “léxico sexual genuíno de tabus Victorianos”, ou como “uma espécie de desafio de wrestling incestuoso, necrófilo, oral-anal-sadístico, tudo misturado”, ou “sexo sem genitais, sexo sem confusão, sexo sem responsabilidade, sexo sem culpa, sexo sem amor - melhor ainda, sexo sem qualquer registo”.
Ondas de histeria vampírica varreram a Europa ao longo do Séc. XVIII, e na altura em que Stoker teve a sua vez com as lendas, já elas tinham sido trabalhadas por Goethe, Coleridge, Byron, Southey, Dumas e outros. O primeiro romance Inglês da linha vampírica foi The Vampire, de John Polidori, escrito em 1819, a partir do fragmento de uma história desenvolvida por Byron, de quem Polidori era médico particular. (O romance de Polidori é por demais relembrado como a resposta a uma das clássicas perguntas em jogos de conhecimento literário: Qual foi a outra história de terror que teve a sua génese na noite literária do Lago Genebra partilhada por Byron e pelos Shelleys?) Apesar de haver um subtexto de sexualidade reprimida, confusa e depravada em muita da literatura de vampiros, alguns biógrafos acreditam que o interesse de Stoker no tema veio menos das lendas do que da sua vida privada, especificamente da sua complexa relação com o famoso actor Henry Irving. Stoker era o agente e companheiro de há longa data de Irving, apaixonado ao ponto de ponto de ter dado ao seu filho o nome de Irving Noel Stoker. Dracula, nesta linha de raciocínio, é uma miscelânea de transferência homoerótica.
Mais tradicional e menos subliminar é a ideia de que o herói de Stoker deriva da sua pesquisa de um príncipe de Wallachia (antigo principado, agora anexado na Roménia) do Séc. XV, Conde Vlad Tepes, ou Vlad o Empalador, filho de Vlad Dracul. Esta ligação é aparentemente errónea: Stoker ia chamar ao seu romance “Conde Wampyr” até à sua pesquisa o ter levado a acreditar, não muito correctamente, que «Dracula» significava «Demónio» na língua Wallachiana. Daí, embora o autor conhecesse pouco ou nada do histórico Vlad, ou da Transilvânia, o livro levou a que ambos fossem consumidos pelo império vampírico. Até há alguns anos atrás, o governo Romeno tinha planos para construir o “Parque Drácula” na cidade medieval de Sighisoara, local de nascimento do Conde Vlad; protestos de estudiosos do vampirismo, defensores da história Romena e activistas anti-Disney levaram a que o projecto fosse mudado para a zona de Bucareste.
Adaptado de um texto de Steve King, publicado no Today in Literature.
domingo, abril 18, 2004
Mil Folhas: Manuel Alegre, "Herman", Rui Araújo, João Ramalho Santos
Manuel Alegre dá uma entrevista a Helena Vasconcelos, directora da revista "Storm", a propósito da recente edição de "Rafael", o seu último livro, publicado pela Dom Quixote.
«Eu era mais camuseano - lia "o Estrangeiro" e dava para meses, para noites de conversa. A Cultura era quase um processo orgânico, passava a fazer parte de nós, não era algo como hoje em dia em que se lêem "abrégés" disto e daquilo. Os filmes - os Fellinis, os Viscontis, os Bergmans eram vistos vezes sem conta, ficávamos noites e noites à conversa...
E as pessoas também viviam através desses mesmos livros, desses mesmos livros, tal como Rafael?
Sim, é por isso que Rafael se desdobra em muitos dessas personagens porque o processo era quase de osmose, na nossa apreensão do mundo. O Rilke, por exemplo, era uma espécie de religião.»
Também Lars Saabye Christensen falou ao Mil Folhas desta semana, num artigo de Maria José Oliveira. O tempo é ainda de promoção do seu "Herman", que recentemente foi traduzido para português pela Cavalo de Ferro, e de que já tínhamos falado aqui no pilha-livros.
«"Herman" está dividido em três capítulos - Outono, Inverno e Primavera (por esta ordem). O escritor explica que esta foi uma "forma de estruturar o livro", mas a escolha das estações do ano têm correspondência directa com os estados de alma do protagonista. Por isso, explica o autor, "acaba na Primavera porque logo a seguir, no Verão, Herman encontra o mundo e transforma-se numa criança mais forte". "Fiquei muito contente com isso", acrescenta o escritor, como se o rumo da personagem lhe tivesse escapado das mãos.»
"Escrevo para não me meter nos copos, para não dar em doido", ou de como Rui Araújo reagiu à sua saída da RTP, após 4 anos na "prateleira". Este é já o seu segundo livro, segunda incursão nos meandros do romance policial. Entrevista conduzida por Isabel Braga, que também faz uma análise da obra.
«Podem não existir polícias exactamente iguais a este, mas, certamente, se Rui Araújo não tivesse conhecido de perto os verdadeiros agentes da Judiciária, não teria sido capaz de criar estas personagens a um tempo exóticas e previsíveis, extraordinariamente humanas, em suma. Ao conhecê-los, pensa-se que não hão-de estar muito longe da realidade e Rui Araújo chegou a elas impelido pelo seu lado de jornalista.»
Na edição on-line não o podemos encontrar, mas ao inquérito desta semana responde João Ramalho Santos, biólogo, professor universitário e crítico de BD, e que merece aqui destaque por (pelo menos) 3 razões.
O último livro que ofereceu foi "Vincent e Van Gogh", de Gradimir Smudja, editado pela Witloof.
A arrumação de livros é feita «por géneros e temas. Ou em pilhas que apenas parecem caóticas para observadores menos atentos...»
E será que consegue escolher o livro da sua vida? «Evidentemente. Parece que o estou a ler agora. Mas nunca me recordo do título. Nem dos autores. Temos muitas vidas, é o que (também) nos vale...»
«Eu era mais camuseano - lia "o Estrangeiro" e dava para meses, para noites de conversa. A Cultura era quase um processo orgânico, passava a fazer parte de nós, não era algo como hoje em dia em que se lêem "abrégés" disto e daquilo. Os filmes - os Fellinis, os Viscontis, os Bergmans eram vistos vezes sem conta, ficávamos noites e noites à conversa...
E as pessoas também viviam através desses mesmos livros, desses mesmos livros, tal como Rafael?
Sim, é por isso que Rafael se desdobra em muitos dessas personagens porque o processo era quase de osmose, na nossa apreensão do mundo. O Rilke, por exemplo, era uma espécie de religião.»
Também Lars Saabye Christensen falou ao Mil Folhas desta semana, num artigo de Maria José Oliveira. O tempo é ainda de promoção do seu "Herman", que recentemente foi traduzido para português pela Cavalo de Ferro, e de que já tínhamos falado aqui no pilha-livros.
«"Herman" está dividido em três capítulos - Outono, Inverno e Primavera (por esta ordem). O escritor explica que esta foi uma "forma de estruturar o livro", mas a escolha das estações do ano têm correspondência directa com os estados de alma do protagonista. Por isso, explica o autor, "acaba na Primavera porque logo a seguir, no Verão, Herman encontra o mundo e transforma-se numa criança mais forte". "Fiquei muito contente com isso", acrescenta o escritor, como se o rumo da personagem lhe tivesse escapado das mãos.»
"Escrevo para não me meter nos copos, para não dar em doido", ou de como Rui Araújo reagiu à sua saída da RTP, após 4 anos na "prateleira". Este é já o seu segundo livro, segunda incursão nos meandros do romance policial. Entrevista conduzida por Isabel Braga, que também faz uma análise da obra.
«Podem não existir polícias exactamente iguais a este, mas, certamente, se Rui Araújo não tivesse conhecido de perto os verdadeiros agentes da Judiciária, não teria sido capaz de criar estas personagens a um tempo exóticas e previsíveis, extraordinariamente humanas, em suma. Ao conhecê-los, pensa-se que não hão-de estar muito longe da realidade e Rui Araújo chegou a elas impelido pelo seu lado de jornalista.»
Na edição on-line não o podemos encontrar, mas ao inquérito desta semana responde João Ramalho Santos, biólogo, professor universitário e crítico de BD, e que merece aqui destaque por (pelo menos) 3 razões.
O último livro que ofereceu foi "Vincent e Van Gogh", de Gradimir Smudja, editado pela Witloof.
A arrumação de livros é feita «por géneros e temas. Ou em pilhas que apenas parecem caóticas para observadores menos atentos...»
E será que consegue escolher o livro da sua vida? «Evidentemente. Parece que o estou a ler agora. Mas nunca me recordo do título. Nem dos autores. Temos muitas vidas, é o que (também) nos vale...»
sexta-feira, abril 16, 2004
Martin Page recebe prémio literário
Há uns tempos atrás falámos aqui do livro "Como Me Tornei Estúpido". Hoje, sai a notícia de que com essa obra, na qual a personagem principal procura a estupidificação como caminho para a felicidade, o seu autor, Martin Page, ganhou o prémio Euregio-Schüler 2004.
De realçar o facto de o júri ser constituído por mais de 300 jovens europeus (e não por um colectivo de especialistas), o que só pode querer dizer que aquele é de facto o caminho certo :)
Publicado em Portugal pela Asa, podemos ler a notícia completa no Diário Digital.
De realçar o facto de o júri ser constituído por mais de 300 jovens europeus (e não por um colectivo de especialistas), o que só pode querer dizer que aquele é de facto o caminho certo :)
Publicado em Portugal pela Asa, podemos ler a notícia completa no Diário Digital.
terça-feira, abril 13, 2004
BLUES FOR MARY JANE - Manuel de Freitas
DON’T SMOKE IN BED
depois de ter relido Música Antológica & Onze Cidades
Lembro-me que era Inverno,
numa aldeia do Ribatejo
que me conheceu demasiado bem.
Surpreendi-me. Nunca tinha visto
tanto charro, tanta música em comum,
na “jovem poesia portuguesa”
- esse frouxo refrão do sangue (se
não mesmo inodoro, a alugar vertigens).
Era eu inédito, desolado. Cultivava o desamor.
Apeteceu-me escrever. Escrever-te.
Mas as palavras demoram às vezes anos
a chegar - e nem por isso nos dão
a garantia de serem necessárias.
Gesto, tolhido, que vai ou não vai
ter ao coração do coração. Tu sabes,
depois do pequeno inferno,
quando já não somos jovens.
Não tinha, nunca terei, canções.
Sei apenas que é de novo Inverno
e que passaram alguns anos,
num bairro tão perto de Lisboa
como o dedo do gatilho ou
a palavra do chão. Ouço Nina
Simone, espero que não te importes,
e pergunto cada vez menos
pelas artérias do lirismo nacional.
O dia, coalhado, vem de onde
não quero. E acho que mudei um pouco,
como tudo. Até fumo por semana
menos charros do que os livros
que entretanto publiquei. De ti,
obviamente, nada mais pude saber.
Chega até de nós, de mansinho, o último livro de Manuel de Freitas. “Blues for Mary Jane”, editado pela &etc, traz-nos este “Don’t Smoke in Bed” e outras memórias tristes, mas sempre bonitas.
depois de ter relido Música Antológica & Onze Cidades
Lembro-me que era Inverno,
numa aldeia do Ribatejo
que me conheceu demasiado bem.
Surpreendi-me. Nunca tinha visto
tanto charro, tanta música em comum,
na “jovem poesia portuguesa”
- esse frouxo refrão do sangue (se
não mesmo inodoro, a alugar vertigens).
Era eu inédito, desolado. Cultivava o desamor.
Apeteceu-me escrever. Escrever-te.
Mas as palavras demoram às vezes anos
a chegar - e nem por isso nos dão
a garantia de serem necessárias.
Gesto, tolhido, que vai ou não vai
ter ao coração do coração. Tu sabes,
depois do pequeno inferno,
quando já não somos jovens.
Não tinha, nunca terei, canções.
Sei apenas que é de novo Inverno
e que passaram alguns anos,
num bairro tão perto de Lisboa
como o dedo do gatilho ou
a palavra do chão. Ouço Nina
Simone, espero que não te importes,
e pergunto cada vez menos
pelas artérias do lirismo nacional.
O dia, coalhado, vem de onde
não quero. E acho que mudei um pouco,
como tudo. Até fumo por semana
menos charros do que os livros
que entretanto publiquei. De ti,
obviamente, nada mais pude saber.
Chega até de nós, de mansinho, o último livro de Manuel de Freitas. “Blues for Mary Jane”, editado pela &etc, traz-nos este “Don’t Smoke in Bed” e outras memórias tristes, mas sempre bonitas.
sábado, abril 10, 2004
Esta semana, no Mil Folhas
«Mas não gosto muito de escrever, não sinto prazer. Tenho mais facilidade em encontrar os erros dos outros do que meus. Tenho de corrigir dez mil vezes cada página. Em voz alta, para perceber a musicalidade.
Isso é um pouco estranho, não?
Se existisse o diabo e o pacto com o diabo, eu fazia um [risos]. Vendia a alma por dez novelas geniais aqui mesmo. E teria toda a fama, toda a glória... Não gosto de escrever, gosto de ensinar. O que penso é que quem gosta de ensinar a escrever tem de provar que sabe escrever... O meu leitor ideal é o jovem que se maravilha com a maravilha da literatura. Como os meus alunos. É para eles que escrevo.»
Quem fala assim é Diego Paszkowski, argentino nascido em 1966, que acaba de ver publicado em Portugal o seu "O Outro Gómez". Deu uma entrevista a Ana Cristina Pereira, que também fez uma análise da obra. Nele, William Puente, um bancário divorciado rendido a uma vida monótona, é raptado depois de o confundirem com um importante membro dum cartel de droga boliviano. Não conseguindo (ou não querendo) corrigir o engano, começa aí a questionar a sua existência tal como a conheceu até ali.
Pelos meandros da máfia e do narcotráfico, mais um policial da colecção Gin Tónico, editado pela Ambar.
"Ma Yan tem catorze anos e vive na província de Ningxia, no noroeste da China. Filha de camponeses pobres, sabe desde cedo que a espera uma vida difícil. Porém, quando se apercebe de que os pais não têm meios para a manter na escola, todos os seus sonhos se esfumam.
Numa missiva pungente, Ma Yan descreve toda a revolta e impotência que sente face a um destino impiedoso. A mãe, transtornada pelo desespero da filha, confia a carta, bem como os três pequenos cadernos que perfazem o diário íntimo da filha, a um grupo de cidadãos franceses que estão de passagem por aquela aldeia do fim do mundo. Entre eles está o jornalista Pierre Haski… O pedido de ajuda acabará por chegar a bom porto!"
Assim se pode ler na promoção a "O diário de Ma Yan", o livro que Pierre Haski publicou, e no qual faz um enquadramento de toda a história desta menina, que agora já tem possibilidades para viver mais condignamente. Alexandra Pereira Coelho entrevista Pierre Haski, e mostra-nos um pouco desta obra, editada em Portugal pela Asa.
Isso é um pouco estranho, não?
Se existisse o diabo e o pacto com o diabo, eu fazia um [risos]. Vendia a alma por dez novelas geniais aqui mesmo. E teria toda a fama, toda a glória... Não gosto de escrever, gosto de ensinar. O que penso é que quem gosta de ensinar a escrever tem de provar que sabe escrever... O meu leitor ideal é o jovem que se maravilha com a maravilha da literatura. Como os meus alunos. É para eles que escrevo.»
Quem fala assim é Diego Paszkowski, argentino nascido em 1966, que acaba de ver publicado em Portugal o seu "O Outro Gómez". Deu uma entrevista a Ana Cristina Pereira, que também fez uma análise da obra. Nele, William Puente, um bancário divorciado rendido a uma vida monótona, é raptado depois de o confundirem com um importante membro dum cartel de droga boliviano. Não conseguindo (ou não querendo) corrigir o engano, começa aí a questionar a sua existência tal como a conheceu até ali.
Pelos meandros da máfia e do narcotráfico, mais um policial da colecção Gin Tónico, editado pela Ambar.
"Ma Yan tem catorze anos e vive na província de Ningxia, no noroeste da China. Filha de camponeses pobres, sabe desde cedo que a espera uma vida difícil. Porém, quando se apercebe de que os pais não têm meios para a manter na escola, todos os seus sonhos se esfumam.
Numa missiva pungente, Ma Yan descreve toda a revolta e impotência que sente face a um destino impiedoso. A mãe, transtornada pelo desespero da filha, confia a carta, bem como os três pequenos cadernos que perfazem o diário íntimo da filha, a um grupo de cidadãos franceses que estão de passagem por aquela aldeia do fim do mundo. Entre eles está o jornalista Pierre Haski… O pedido de ajuda acabará por chegar a bom porto!"
Assim se pode ler na promoção a "O diário de Ma Yan", o livro que Pierre Haski publicou, e no qual faz um enquadramento de toda a história desta menina, que agora já tem possibilidades para viver mais condignamente. Alexandra Pereira Coelho entrevista Pierre Haski, e mostra-nos um pouco desta obra, editada em Portugal pela Asa.
segunda-feira, abril 05, 2004
O MÉTODO DA PROPULSÃO PERPÉTUA - Abel Barros Baptista
Vejamos as coisas por este prisma:
« - Creio que o único meio de os livros hoje se distinguirem é não se publicarem.»
Este é um pequeno e delicioso livro, que devia de constar em todos os bolsos... Sim, porque cabe no bolso!!! Genial a formatação do texto, que permite um brilhante final.
«Havia lançamentos de livros que distinguiam livros que eram já de si distintos: autores importantes, significativos, bem conhecidos, publicavam mais um livro, coisa nem sempre ao alcance de todos, e o editor conclamava os leitores fiéis a reunirem-se em evento celebrante. E instrutivo; sobretudo plenamente justificado. Lá iam muitos, e note a senhora que antes de chegarem aos copos forçavam-se a ouvir um crítico, aliás bem escolhido, que perorava, apresentando o livro. Contente, o crítico, pois fora escolhido. Tinha ganho aos outros, estava à frente, merecera a honra, subida honra, de ler o manuscrito, ou as provas; talvez tivesse até conversado com o autor. Por isso exibia satisfação, até contagiosa, sobretudo se confundida com o entusiasmo causado pela leitura.»
O Método da Propulsão Perpétua, de Abel Barros Baptista. Livros Cotovia, 2003. 24 pags.
PS: O risco de sair na Pontinha não é assim tão grande.
« - Creio que o único meio de os livros hoje se distinguirem é não se publicarem.»
Este é um pequeno e delicioso livro, que devia de constar em todos os bolsos... Sim, porque cabe no bolso!!! Genial a formatação do texto, que permite um brilhante final.
«Havia lançamentos de livros que distinguiam livros que eram já de si distintos: autores importantes, significativos, bem conhecidos, publicavam mais um livro, coisa nem sempre ao alcance de todos, e o editor conclamava os leitores fiéis a reunirem-se em evento celebrante. E instrutivo; sobretudo plenamente justificado. Lá iam muitos, e note a senhora que antes de chegarem aos copos forçavam-se a ouvir um crítico, aliás bem escolhido, que perorava, apresentando o livro. Contente, o crítico, pois fora escolhido. Tinha ganho aos outros, estava à frente, merecera a honra, subida honra, de ler o manuscrito, ou as provas; talvez tivesse até conversado com o autor. Por isso exibia satisfação, até contagiosa, sobretudo se confundida com o entusiasmo causado pela leitura.»
O Método da Propulsão Perpétua, de Abel Barros Baptista. Livros Cotovia, 2003. 24 pags.
PS: O risco de sair na Pontinha não é assim tão grande.
sábado, abril 03, 2004
Mil Folhas: José Saramago, Maria do Rosário Pedreira
O novo livro de José Saramago já chegou às livrarias e delas tem vindo a sair a grande velocidade. O Nobel da literatura português é hoje, mais que nunca, um impressionante fenómeno de vendas, e este Ensaio sobre a Lucidez (Caminho) tem entrada garantida em todos os cantos da nossa sociedade.
E a pergunta que se faz é: como reagiria a sociedade, e em particular o poder político, se nas eleições fosse registado 83 por cento de votos em branco? Talvez pela importância e pelo eco que hoje se dá às suas opiniões e ideias, esta obra aparece-nos analisada nos meios de comunicação social como se de um ensaio se tratasse, quase como uma declaração de intenções ou manifesto político. Para abordar essas e outras questões, José Saramago em entrevista a Eduardo Dâmaso, que faz também uma análise da obra.
Já falámos aqui de Nenhum Nome Depois (Gótica), e esta semana Fernando Pinto do Amaral relembra-nos a poesia de Maria do Rosário Pedreira. Às voltas com o amor, a sua dor e redenção, o amor romântico e o fraternal.
«Não, prefiro não saber como te chamas», e seguir por estes caminhos de amores perdidos e achados.
E a pergunta que se faz é: como reagiria a sociedade, e em particular o poder político, se nas eleições fosse registado 83 por cento de votos em branco? Talvez pela importância e pelo eco que hoje se dá às suas opiniões e ideias, esta obra aparece-nos analisada nos meios de comunicação social como se de um ensaio se tratasse, quase como uma declaração de intenções ou manifesto político. Para abordar essas e outras questões, José Saramago em entrevista a Eduardo Dâmaso, que faz também uma análise da obra.
Já falámos aqui de Nenhum Nome Depois (Gótica), e esta semana Fernando Pinto do Amaral relembra-nos a poesia de Maria do Rosário Pedreira. Às voltas com o amor, a sua dor e redenção, o amor romântico e o fraternal.
«Não, prefiro não saber como te chamas», e seguir por estes caminhos de amores perdidos e achados.
quinta-feira, abril 01, 2004
Argumento Adaptado: O GRANDE PEIXE (1ª parte)
«A sua grande promessa
Dizem que ele nunca se esquecia de um nome, de uma cara ou da cor favorita de alguém e que, aos doze anos, conhecia todas as pessoas da vila onde vivia pelo som que os sapatos delas faziam quando andavam.
Dizem que cresceu tanto em tão pouco tempo - meses?, quase um ano? - que teve de ficar de cama, pois a calcificação dos ossos não acompanhava a ambição da sua altura, de modo que, quando tentava ficar de pé, oscilava como uma trepadeira e caía ao chão como um monte de trapos.
Edward Bloom utilizava o seu tempo sabiamente, a ler. Leu quase todos os livros que existiam em Ashland. Mil livros - há quem diga dez mil. De História, de Arte, de Filosofia, de Horatio Alger. O que calhava. Leu-os todos. Até a lista telefónica.
Dizem que acabou por saber mais do que qualquer outra pessoa, mesmo do que Mr. Pinkwater, o bibliotecário. Já nessa altura o meu pai era um grande peixe.» pág. 22
Com O Grande Peixe em exibição nos cinemas em todo o país (já deve ser difícil apanhá-lo por estes dias), a Temas e Debates aproveitou para traduzir para português a obra que lhe deu origem. Primeiro romance de Daniel Wallace, até então mais virado para os contos (que viu publicados em diversas revistas), e que hoje em dia trabalha como ilustrador, este livro leva-nos de novo (para quem já viu o filme) para o estranho e bizarro mundo de Edward Bloom, a quem a morte é a pior coisa que lhe podia ter acontecido...
Seguindo uma certa linha cronológica, poderemos acompanhar a sua vida desde o momento do nascimento, e constatar que foi logo aí que começou a formar-se a reputação de grande homem, extraordinário; no fundo, um grande peixe.
O Grande Peixe (Big Fish: A Novel of Mythic Proportions), de Daniel Wallace (trad. Ana Falcão Bastos), da Temas e Debates, Março 2004 (1ª edição; ed. original: 1998), 175 págs., pvp: 15,95€
«O seu encanto discreto
Dizem que ele tinha um encanto especial, o dom da modéstia, uma propensão para ficar de súbito pensativo. O meu pai era... tímido. Apesar disso, as mulheres requestavam-no. Digamos que tinha um encanto discreto. Era também muito atraente, embora nunca permitisse que isso lhe subisse à cabeça. Era amigo de toda a gente e toda a gente era sua amiga.
Já nessa altura, diziam que tinha muita graça. Que sabia contar boas anedotas. Não quando se encontrava em grandes grupos, circunstância em que se mantinha reservado; mas quando o punham à vontade - como muitas mulheres de Ashland tentavam fazer! - fazia uma pessoa rir. Consta que se ouvia o riso deles à noite, do meu pai e dessas raparigas encantadoras, que se ouviam as suas gargalhadas animadas ecoarem pela cidade durante a noite, vindas do baloiço do alpendre da casa dele. O riso era o som preferido dos habitantes de Ashland para adormecerem. Eram assim as coisas naquele tempo.» pág. 36
to be continued...
Dizem que ele nunca se esquecia de um nome, de uma cara ou da cor favorita de alguém e que, aos doze anos, conhecia todas as pessoas da vila onde vivia pelo som que os sapatos delas faziam quando andavam.
Dizem que cresceu tanto em tão pouco tempo - meses?, quase um ano? - que teve de ficar de cama, pois a calcificação dos ossos não acompanhava a ambição da sua altura, de modo que, quando tentava ficar de pé, oscilava como uma trepadeira e caía ao chão como um monte de trapos.
Edward Bloom utilizava o seu tempo sabiamente, a ler. Leu quase todos os livros que existiam em Ashland. Mil livros - há quem diga dez mil. De História, de Arte, de Filosofia, de Horatio Alger. O que calhava. Leu-os todos. Até a lista telefónica.
Dizem que acabou por saber mais do que qualquer outra pessoa, mesmo do que Mr. Pinkwater, o bibliotecário. Já nessa altura o meu pai era um grande peixe.» pág. 22
Com O Grande Peixe em exibição nos cinemas em todo o país (já deve ser difícil apanhá-lo por estes dias), a Temas e Debates aproveitou para traduzir para português a obra que lhe deu origem. Primeiro romance de Daniel Wallace, até então mais virado para os contos (que viu publicados em diversas revistas), e que hoje em dia trabalha como ilustrador, este livro leva-nos de novo (para quem já viu o filme) para o estranho e bizarro mundo de Edward Bloom, a quem a morte é a pior coisa que lhe podia ter acontecido...
Seguindo uma certa linha cronológica, poderemos acompanhar a sua vida desde o momento do nascimento, e constatar que foi logo aí que começou a formar-se a reputação de grande homem, extraordinário; no fundo, um grande peixe.
O Grande Peixe (Big Fish: A Novel of Mythic Proportions), de Daniel Wallace (trad. Ana Falcão Bastos), da Temas e Debates, Março 2004 (1ª edição; ed. original: 1998), 175 págs., pvp: 15,95€
«O seu encanto discreto
Dizem que ele tinha um encanto especial, o dom da modéstia, uma propensão para ficar de súbito pensativo. O meu pai era... tímido. Apesar disso, as mulheres requestavam-no. Digamos que tinha um encanto discreto. Era também muito atraente, embora nunca permitisse que isso lhe subisse à cabeça. Era amigo de toda a gente e toda a gente era sua amiga.
Já nessa altura, diziam que tinha muita graça. Que sabia contar boas anedotas. Não quando se encontrava em grandes grupos, circunstância em que se mantinha reservado; mas quando o punham à vontade - como muitas mulheres de Ashland tentavam fazer! - fazia uma pessoa rir. Consta que se ouvia o riso deles à noite, do meu pai e dessas raparigas encantadoras, que se ouviam as suas gargalhadas animadas ecoarem pela cidade durante a noite, vindas do baloiço do alpendre da casa dele. O riso era o som preferido dos habitantes de Ashland para adormecerem. Eram assim as coisas naquele tempo.» pág. 36
to be continued...
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