«Receio que a obra de Robert Musil, hoje acessível aos leitores franceses graças aos esforços de um tradutor corajoso, seja elogiada de olhos fechados. Receio igualmente o contrário: que seja mais comentada do que lida, pois oferece aos críticos, graças ao seu invulgar desígnio, às suas qualidades contraditórias, às dificuldades da sua realização e à profundidade do seu malogro, tudo aquilo que os atrai, tão próxima do comentário que muitas vezes parece ter sido comentada, mais do que escrita, e poder ser criticada em vez de lida. Com que maravilhosos problemas, insolúveis, inesgotáveis, esta grandiosa tentativa nos deleita! E a que ponto nos pode agradar, tanto pelos seus defeitos de primeiro grau como pelo refinamento das suas qualidades, pelo que tem de excessivo e, nesse excesso, de contido, e finalmente pelo seu fracasso imponente. Mais uma obra imensa e inacabada e inacabável. Mais uma vez a surpresa de um monumento admiravelmente em ruínas.»
excerto de O Livro por Vir, de Maurice Blanchot, Relógio d'Água, 2001, pág.145. edição original: Le Livre a Venir (1959).
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