Originalmente editado em 1984, já foram vendidos mais de 200 mil exemplares de Beatles na Noruega, o país natal do autor.
«Estava deitado à espera que a mãe e o pai se fossem deitar. Se acendesse a luz agora viriam perguntar o que se passava porque conseguiam ver por uma frecha sob a porta a luz acesa. Ouvia a chuva, lá fora, ouvia os comboios a passar a menos de cem metros, entre o meu quarto e a baía de Frogner. Eu sabia perfeitamente para onde iam, mas também não haviam assim tantas linhas por onde escolher. E apesar de não irem para muito longe e de se manterem dentro do país faziam-me sempre pensar em terras distantes, como aquelas suspensas em rolos por cima do quadro da escola, e quando ouvia os comboios pensava em estrelas também, e no Universo, e tudo se esvanecia e eu caía para trás, como que para dentro de mim mesmo, e se eu gritasse vinham a mãe e o pai a correr, e eram como pontinhos pequeninos, lá ao longe, e arrastavam-me de volta. Mas desta vez não gritei. Ouvia os comboios e o zunido do eléctrico a atravessar a Praça Olaf Bull. E misturado com isto tudo estavam as vozes abafadas da mãe e do pai e o rádio sempre ligado e sempre com ópera que me soava tão solitária, mais triste que qualquer outra coisa que eu conhecia, um cantar de outro mundo, um mundo pardo e sem movimento, um cantar frio e morto. E nas paredes à minha volta estavam penduradas fotos de caras que também cantavam, mas não se ouvia um som que fosse, as guitarras e as baterias estavam silenciosas. Rolling Stones, Animals, Dave Clark Five, Hollies, Beatles. Beatles. Fotos dos Beatles. E eu sonhava com Ringo e John e George e Paul. Sonhava que era um deles, que era o Paul McCartney, com a sua cara redonda e olhar melancólico que levava todas as miúdas à berraria descontrolada, sonhava que era canhoto e tocava baixo. Sentei-me de arranque na cama, acordadíssimo. Mas eu sou um deles, pensei em voz alta, e ri. Eu sou um dos Beatles.»
do Capítulo I
Herman, editado originalmente em 1988, foi adaptado ao cinema em 1990, com realizaçao de Erik Gustavson.
«Aquela que parece ser uma história simples sobre uma criança que vive o seu primeiro drama e sofre a primeira rejeição por parte dos que a rodeiam, é um lúcido ensaio sobre a formação da identidade e as relações da criança em formação com a sociedade.»
da página da Cavalo de Ferro
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